quarta-feira, 16 de maio de 2012

Shortlist: Lacina Traoré

Traoré ainda ao serviço do seu antigo clube, o Cluj
 
Do ainda longínquo futebol russo, mais detalhadamente do Kuban Krasnodar, surge-nos este colosso costa marfinense, de seu nome Lacina Traoré. A sua impressionante estampa física (203cm para 87 kg) poderia, numa primeira análise, fazer pensar que se trata de um ponta de lança muito limitado tecnicamente. Trata-se, porém, de um atleta tecnicamente muito dotado, com uma excelente mobilidade, sendo que o seu físico longilíneo permite-lhe uma passada larga e uma capacidade de drible interessante.

Ainda muito jovem (21 anos), começou a sua carreira no seu país natal, no Stade d'Abidjan, tendo posteriormente sido transferido para os romenos do Cluj na temporada 2007/2008, onde passou quatro épocas, tendo marcado 14 golos em 44 jogos, marca interessante para um jogador da sua idade.

O sucesso desportivo e o enorme potencial demonstrado na Roménia valeu-lhe uma transferência para o cada vez mais interessante e competitivo campeonato russo, onde esta época, ao serviço do Kuban, apontou 18 golos, conseguindo conquistar o terceiro lugar do pódio dos melhores marcadores.

De uma certa forma, é um jogador que me faz lembrar Adebayor ou até Ibrahimovic no início da sua carreira. Excelente capacidade física, joga muito bem de costas para a baliza, guardando-a dos adversários, o que permite abrir espaços para servir os seus colegas de ataque, ou, como faz amiúde, rodar e rematar para o golo. No entanto, e apesar da sua altura, ainda não é tão forte no jogo de cabeça como seria de esperar, algo que poderá, no entanto, aperfeiçoar ao longo do tempo, dada a sua juventude.

Uma boa oportunidade de negócio, uma vez que milita num clube russo de segundo plano que não tem grandes aspirações a nível interno. Gostaria de vê-lo num campeonato mais competitivo, como por exemplo na Premier League, onde poderia desenvolver todo o seu potencial e tornar-se num jogador de excelência. A seguir com atenção.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Mais que um estádio... uma bancada: Spion Kop!


É no estádio que tudo acontece. É lá que os adeptos indefectíveis se reúnem, faça chuva ou sol, para apoiar o seu clube, e onde as claques preparam coreografias de fazer corar qualquer encenador. É no estádio que os jogadores demonstram a sua habilidade, ou falta dela, levando a que uns entrem no grupo restrito daqueles que serão eternamente recordados e que outros fiquem vetados ao esquecimento.

Existem estádios que impressionam (ou impressionavam) pela sua grandeza: o Camp Nou (Barcelona), o Maracanã (Rio de Janeiro), o Estádio Azteca (Cidade do México) ou o antigo Estádio da Luz, qualquer um deles, nos seus tempos áureos, com capacidade para mais de 100.000 espectadores!!! Também há os que encantam pela sua beleza - o Allianz Arena (Munique), o Emirates e o novo Estádio de Wembley (ambos em Londres) – ou pela sua singularidade – o Estádio Axa (Braga). E ainda há os estádios míticos, nomeadamente em Inglaterra, que sobrevivem a longas décadas de jogos semana-sim semana-não, testemunhos “vivos” da história de clubes como Manchester United, Tottenham, Newcastle ou Everton, só para citar alguns.

E depois... Bem depois existe uma bancada que transcende a relevância do seu próprio estádio. O estádio: Anfield, casa do Liverpool F.C. A bancada: Spion Kop, o topo sul do estádio.



Baptizada assim pelo jornalista local Ernest Edwards, o nome Spion Kop ficou a dever-se a um monte situado na África do Sul, um local estratégico de elevada importância militar na Segunda Guerra do Boers (1899–1902) e onde centenas de soldados britânicos perderam a vida, muitos deles oriundos da zona de Liverpool. Ainda que vários tenham sido os estádios britânicos (de futebol e não só) a adoptar “Spion Kop” ou “The Kop” para nome de alguma das suas bancadas, a verdade é que foi a de Anfield que se notabilizou e conquistou um espaço na história do futebol mundial. Foi aquela bancada, pela força que dela emanava, que empurrou o Liverpool F.C., um clube de uma cidade de apenas 400.000 habitantes, para conquistas invejáveis e quase inimagináveis, inspirando jogadores como Bruce Grobbelaar, Ray Clemence, Graeme Souness, Kevin Keegan, Ian Callaghan, Kenny Dalglish ou Ian Rush naquela notável era que se estendeu desde meados da década de 70 até ao fim da década de 80, e que se saldou, entre outros, em 10 títulos de campeão inglês (em 15 possíveis) e em 4 Taças dos Campeões Europeus.



É na Spion Kop que o lema “You’ll never walk alone” tão invocado pelos adeptos do Liverpool F.C. ganha expressão… De facto, ainda que despida de adeptos, ali entoam permanentemente as “vozes” de todos aqueles que partiram e que a bancada pretende homenagear, o que faz da Spion Kop maior do que qualquer estádio!

terça-feira, 1 de maio de 2012

No man is an island ou a estranha forma de vida de um guarda redes

No man is an island, ou, traduzindo para português, "Nenhum homem é uma ilha", é uma conhecida frase do poeta inglês John Donne, cujo significado procura ilustrar que o homem não é feito para viver sozinho, isolado da restante comunidade. Porém, o futebol nem sempre segue os predicados da vida dita "normal", e em particular, uma posição em especial contraria toda essa linha de pensamento filosófico: o guarda redes.

Ser guarda redes é a apologia da solidão, um acto de rebeldia, é ser diferente dos outros. No seu reino - a grande área - ele é rei e senhor, sendo o último bastião do seu exército, onde só se lembram dele quando tudo o resto já caiu. Durante o resto do jogo, o guarda redes é apenas um mero espectador, um espectro que parece deslocado do jogo. Por isso, pergunto-me várias vezes o que se passará na cabeça de um guarda redes durante uma partida: no que pensará Victor Valdés quando passa cerca de 80 minutos inactivo enquanto o seu Barça aborrece e cilindra (por esta ordem) os adversários com o seu tiki taka?

No entanto, existe apenas uma situação na qual o guarda redes pode ter mais notoriedade do que um virtuoso do meio campo ou de um bomber de grande área: o penalty. No fundo, trata-se de uma situação "carne para canhão" onde o guarda redes nada tem a perder. Muito pelo contrário, só tem a ganhar. Se for golo, o avançado não fez mais que a sua obrigação: afinal de contas, estamos a falar de um remate sem oposição a 11 metros da baliza. Porém, se o guarda redes defender, passa automaticamente a ser o herói e a ser visto com outros olhos. Vida ingrata, esta. Ingrata para uns, mas grata para outros, que devido ao facto de terem brilhado na defesa de grandes penalidades, viram reconhecido internacionalmente o seu brilhantismo, quando se não se tivessem evidenciado nessa particularidade, nunca seriam vistos como mais do que um mero guarda redes mediano: falo, por exemplo, do nosso Ricardo ou do argentino Sergio Goycochea, figura do Mundial '90.

Relativamente ao português, a história é bem conhecida de todos: é o guarda redes que defendeu sem luvas o penalty de Vassell, no Euro 2004 (e logo se seguida marcou ele próprio o penalty da vitória da Selecção das Quinas frente aos ingleses), e que, no Mundial 2006, voltou a fazer chorar a nação inglesa ao defender três penalties na mesma série de desempate, após um empate a zero no tempo regulamentar, em plenos quartos de final de um Campeonato do Mundo. Caso estes episódios nunca tivessem acontecido, provavelmente Ricardo nunca teria o empolamento e a notoriedade que teve, nunca ultrapassando a imagem de um guarda redes com relativo potencial, capaz do melhor e do pior no mesmo jogo.

 Ricardo, no momento em que defende o penalty de Darius Vassell, no Euro 2004

Por sua vez, a história de Sergio Goycochea acaba por ser mais típica de novela sul americana. Convocado para o Mundial '90, em Itália, como suplente do mítico Nery Pumpido, o guarda redes foi para o torneio convencido que nunca iria sair do banco de suplentes. Porém, no segundo jogo da fase de grupos, frente à União Soviética, Nery Pumpido lesiona-se gravemente aos 11 minutos, dando lugar ao seu suplente, precisamente Sergio Goycochea, que viria a ser determinante nos quartos de final frente à Jugoslávia de Ivkovic, ao defender dois penalties no desempate por grandes penalidades (3-2 p., após 0-0 nos 90 minutos), bem como nas meias finais frente à Itália (4-3 p. após empate a um no tempo regulamentar), defendendo os remates da marca de 11 metros de Roberto Donadoni e de Aldo Serena. Na grande final, frente à Alemanha, foi no entanto incapaz de defender o penalty de Andreas Brehme, aos 83 minutos de jogo, que viria a atribuir o ceptro de campeões do mundo aos alemães.

 Sergio Goycochea

Sem estes episódios, Ricardo e Goyco nunca teriam saído da sombra do quase anonimato. Seriam apenas mais um entre milhares de guarda redes internacionais medianos. Ser guarda redes, uma estranha forma de vida.