Derby com travo a Scotch
O que têm em comum Lisboa, Buenos
Aires, Rio de Janeiro, São Paulo, Milão, Roma, Glasgow, Atenas, Londres,
Liverpool ou Istambul? São capitais? Nem todas... Têm praias? Nem todas... Há
algo mais forte que as une: são todas palco dos maiores e mais apaixonantes
derbies à face da terra! Derby é a
expressão há largos anos importada de terras de sua majestade para definir os
embates entre dois clubes da mesma cidade que ao longo de largos anos foram
construindo uma rivalidade que se estende muito para lá das quatros linhas.
Tudo é motivo de despique. Tudo se discute. Quem tem mais títulos? Qual o
estádio mais bonito? Quem tem mais adeptos? Quais os adeptos mais fiéis? As
clivagens são permanentes e inevitáveis.
Mas não haverá um traço comum
entre estes adeptos? Um ponto de indubitável concórdia? Claro que sim: a
paixão... Paixão não só no sentido mais imediato de amor ao respectivo clube
mas também como contraposição à racionalidade com que se vive o dia-a-dia mas
que fica descurada quando a bola começa a rolar ou sempre que a rivalidade vem
ao de cima. A paixão naquela primeira acepção justifica, por exemplo, o êxtase
que sentimos com as vitórias e glórias do nosso clube, explica a saudade que nos
invade sempre que ficamos demasiado tempo sem ver o nosso clube jogar, mas
também se manifesta nas noites mal dormidas, perda de apetite, e demais sintomas
habituais em momentos de derrota. Já a paixão no segundo sentido confunde-se
com loucura e irracionalidade. Aquela que explica a visão deturpada dos lances
polémicos (quase) sempre a favor do nosso clube (por muito que as imagens
evidenciem o contrário), justifica os cabelos arrancados, os objectos partidos e
incontáveis outras atitudes irreflectidas.
E que dizer dos derbies em si? Cada
desafio é único, irrepetível, e representa uma nova página na história dos
eternos rivais. São estes jogos que imortalizam jogadores, definem treinadores
e prendem os amantes do futebol... mesmo aqueles que não são adeptos dos clubes
em contenda! No entanto, não raras vezes, aquilo que se eterniza na memória não
é o resultado em si mas antes uma finta desconcertante, um corte in extremis, uma defesa impossível… um
momento!
E foi um destes momentos,
protagonizado por um técnico escocês, num derby escaldante, que o imortalizou
para sempre na história do clube e principalmente na lembrança daqueles que
observaram aqueles instantes. O técnico: Graeme Souness. O derby: Galatasaray –
Fenerbahce.
Tudo ocorreu a 24 de Abril de
1996, em jogo a contar para a 2ª mão da Final da Taça da Turquia. Após jogar a
1ª mão em casa, no estádio Ali Sami Yen, a equipa orientada por Graeme Souness
partiu para a 2ª mão com uma vantagem de 1-0 sobre os rivais do Fenerbahce. Fazendo
valer o factor casa, o Fenerbahce consegue vencer o Galatasaray igualmente por
1-0 obrigando a um prolongamento para definir o vencedor. Nesse prolongamento a
equipa de Graeme Souness superioriza-se e logra o empate 1-1, arrebatando a
Taça da Turquia em pleno estádio inimigo. A apoteose é grande entre jogadores,
técnicos e dirigentes do Galatasaray. Entre os rituais de festejo está uma
bandeira a circular de mão em mão pelos elementos da equipa vencedora… Até que
chega às mãos de Souness. Nesse momento, e após ser provocado por um dirigente
do Fenerbahce que o chamou de “aleijado” (em alusão a uma intervenção cirúrgica
a que recentemente havia sido sujeito), Souness corre para o centro do relvado e
espeta a bandeira do Galatasaray no círculo central, mesmo no coração do
território inimigo, como se de um conquistador se tratasse.
Mais do que o resultado, mais do que o título, foi aquele momento que notabilizou a etapa de Souness enquanto técnico do Galatasaray. Tudo graças à rivalidade, à paixão... a um derby com travo a Scotch!
Mais do que o resultado, mais do que o título, foi aquele momento que notabilizou a etapa de Souness enquanto técnico do Galatasaray. Tudo graças à rivalidade, à paixão... a um derby com travo a Scotch!
7 comentários:
Não sabia! Fazer isso na Turquia e viver para contar é material para o CV de qualquer um lol
Já não me devo lembrar muito bem, mas o Souness cá até deixou uma imagem de gentleman não foi? Há algum episódio estranho cá?
Episódios etsranhos de cá? Contratar o Michael Thomas, ou o Gary Charles...
Relativamente ao post em si, também desconhecia essa história. De facto, o futebol leva-nos a tomar atitudes irreflectidas, mas imbuídas de paixão e simbolismo.
o Souness, ainda que um gentleman, já havia tido uns episódios de rebeldia enquanto treinador dos Rangers também... por cá não teve nada de extraordinário a não ser aquela célebre conferência de imprensa em que disse que o Thomas "has big balls"... lol
Michael Thomas era jogador de CM2 lool
É a arena moderna onde um zé-ninguém se pode transformar em herói! Este episódio é brilhante mesmo.
Se tivessemos um treinador ou jogadores que nos derbies fizessem aquilo, eram os maiores! Mas só temos panhonhas que os perdem sem dó nem piedade.
Desconhecia este episódio. Épico, mesmo.
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